Amar ao Próximo como a Si Mesmo
Sérgio Biagi Gregório
SUMÁRIO: 1. Introdução. 2. Contexto em que a Frase foi Proferida. 3. O Amor.
4. O Próximo. 5. O Si Mesmo. 6. Amor ao Próximo e a Violência. 7. Praticando
o Amor ao Próximo. 8. Conclusão. 9. Bibliografia Consultada
1. INTRODUÇÃO
O objetivo deste estudo é analisar cada um dos termos da frase, ou
seja, "o amar", "o próximo" e "o si mesmo",
extraindo daí conhecimentos mais profundos sobre o alcance moral de tal
assertiva.
2. CONTEXTO EM QUE A FRASE FOI PROFERIDA
O contexto é o do Novo Testamento. O Novo Testamento faz parte da
Bíblia e retrata a vida e obra de Jesus Cristo. Jesus Cristo, quando esteve
encarnado, viveu em lugares administrados pelos governadores romanos, que
impunham o seu poder de forma arbitrária, sobrecarregando os habitantes da
Palestina e demais regiões. A pregação evangélica de Jesus não tinha outro
senão o caráter de libertação desse jugo. A frase lapidar "dar a César o
que é de César e a Deus o que é de Deus" caracteriza bem esse momento
histórico: se o povo da Palestina era obrigado a pagar o impostos, deveria
fazê-lo, porém jamais se esquecendo de reverenciar a Deus.
O texto evangélico diz o seguinte: "Os fariseus, tendo sabido que
ele tinha feito calar a boca aos Saduceus, reuniram-se; e um deles, que era
doutor da lei, veio lhe fazer esta pergunta para o tentar: Mestre, qual é o
maior mandamento da lei? Jesus lhe respondeu: Amareis o Senhor vosso Deus de
todo o vosso coração, de toda a vossa alma, e de todo o vosso espírito; é o
primeiro e o maior mandamento. E eis o segundo que é semelhante àquele:
Amareis o vosso próximo como a vós mesmos. Toda a lei e os profetas estão
contidos nestes dois mandamentos". (Mateus, 22, 34 a 40)
Essas duas frases, juntas, transformam-se no 11.º Mandamento, ou seja,
"Amar a Deus sobre todas as coisas e ao próximo como a si mesmo", e
que resume toda a doutrina de Jesus.
3. O AMOR
Amor do lat. amore é um vocábulo polissêmico, ou
seja, suscetível de diversas definições. Por isso, diz-se que o amor não é
definível, visto encerrar uma vastíssima escala de genitivos e de
nominativos. Concede-se, porém, algumas aproximações, na maioria das vezes
distantes do conteúdo amplo que o termo encerra.
Na cultura grega, amar implica o conhecer e o conhecer implica o amar.
Na cultura judeo-cristã ou bíblica, o amor não partirá do mundo nem do
homem, mas de Deus. Fundado no amor divino, o amor humano será ativo,
histórico, concreto e terá na imitação do próprio Deus, designadamente
através de Cristo - imitatio Christi - o seu grande motor.
(Enciclopédia Verbo da Sociedade e do Estado)
Embora o termo amor seja polissêmico, nada nos impede de defini-lo
como "a totalidade dos sentimentos e desejos que estruturam
o pensamento para a liberação de energia e de forças que guiam a ação na
produção do bem e possibilitam a aquisição de qualidades, constituintes do
crescimento do Espírito". (Curti, 1981, p.81)
Lembremo-nos de que esta palavra é sempre ativa, ou seja, parte do
sujeito para o exterior. Nesse sentido a frase "estar caído por
alguém" pode ser colocada em dúvida, pois estar caído é estar
subitamente no chão, submisso, passivo, o que contraria o elemento dinâmico
que o termo implica.
4. O PRÓXIMO
Cada pessoa em particular (parente, amigo etc.); o nosso semelhante:
Amar o próximo como a si mesmo; o conjunto de todos os homens.
A Parábola do Bom Samaritano ajusta-se bem à reflexão sobre "quem
é o meu próximo".
O que nos diz essa Parábola?
"E eis que se levantou um doutor da lei e lhe disse: Mestre, que
ei de fazer para entrar na posse da vida eterna? Disse-lhe então Jesus: Que é
que está escrito na lei? Como a lês tu? Ele, respondendo, disse: Amarás o
Senhor teu Deus de todo o teu coração, de toda a tua alma, de todas as tuas
forças e de todo o teu entendimento, e ao teu próximo como a ti mesmo. E
Jesus lhe disse: Respondeste bem, faze isso e viverás.
Mas ele, querendo justificar-se, disse a Jesus: E quem é o meu
próximo? Jesus, prosseguindo disse-lhe:
Um homem descia de Jerusalém a Jericó e caiu nas mãos de salteadores,
que o despojaram e se foram, deixando-o semimorto. Aconteceu que pelo mesmo
caminho desceu um sacerdote, que o viu e passou de largo. Do mesmo modo um
levita, que também foi ter àquele lugar, viu o homem e passou de largo. Um
Samaritano , porém, seguindo o seu caminho, veio onde estava o homem e ao
vê-lo se encheu de compaixão. Aproximou-se dele, pensou-lhe as feridas,
deitando nelas óleo e vinho, colocou-o sobre a sua alimária e o levou para
uma hospedaria, onde cuidou dele. No dia seguinte, tirou dois denários e os
deu aos hospedeiro, dizendo: Trata desse homem e na minha volta te pagarei
tudo quanto despenderes a mais.
Qual dos três te parece que tinha sido o próximo daquele que caiu nas
mãos dos salteadores? Respondeu o doutor da lei: O que para com ele usou de
misericórdia (o que é?). Pois vai, disse-lhe Jesus, e faze o mesmo".
(Lucas, 10, 25 a 37).
Jesus quis demonstrar com essa parábola que a caridade, a salvação da
alma independe do credo religioso que se professa. Importa auxiliar o próximo
independentemente dele professar ou não a nossa religião.
5. O SI MESMO
Para entender a profundidade desta frase, deveríamos partir de nós
mesmos, ou seja, cada qual procurando conhecer a si mesmo. Mas será isso
possível? Como?
Sócrates, na sua maiêutica, levava cada um de seu interlocutor a
refletir sobre si mesmo no sentido de tomar consciência da sua própria
ignorância, e com isso adquirir o verdadeiro conhecimento. Como o
conhecimento tinha relação com o bem, quanto mais a pessoa sabia, menos mal
praticava. A título de ilustração, convém diferenciar o termo ter
conhecimento do conhecer. Ter conhecimento é
memorizar, é saber de cor, é estudar para passar de ano. Conhecer,
por outro lado, é processo sempre ativo de aprimoramento pessoal.
Na resposta à pergunta n.º 876 — Fora do direito consagrado pela lei
humana, qual a base da justiça fundada sobre a lei natural? — de O
Livro dos Espíritos, há alusão a uma frase, semelhante a esta, dita por
Cristo: "Querer para os outros os que quereis para vós mesmos". Os
Espíritos orientam-nos que o "critério da verdadeira justiça é o de se
querer para os outros aquilo que se quer para si mesmo, e não de querer para
si o que se deseja para os outros, o que não é a mesma coisa. Como não é
natural que se queira o próprio mal, se tomarmos o desejo pessoal por norma
ou ponto de partida, podemos estar certos de jamais desejar para o próximo
senão o bem".
6. AMOR AO PRÓXIMO E A VIOLÊNCIA
Se Jesus nos ensinou a lei do amor, por que a violência nos dias
atuais? Esquecemo-nos dos seus ensinamentos? Estamos deveras condicionados
pela sociedade? Falta-nos a educação necessária?
Relacionamos abaixo alguns pensamentos que podem auxiliar a refrescar
a nossa memória no tempo.
- Ato de criação bíblico é um ato de violência, pois não houve perdão
por parte de Deus para com Adão e Eva.
- A Lei de talião da Antigüidade.
- Hegel concebeu toda a história como uma luta de contrários.
- Darwin colocou como motor da evolução a seleção natural na luta pela
vida.
- Marx constrói a sua filosofia em cima da luta de classes.
- Hobbes formula a idéia dizendo que o "homem é o lobo do próprio
homem".
- Se o Estado mata, por que a criança não pode matar?
- Consumismo exacerbado pelos meios de comunicação social.
- O discurso de auto-ajuda como fonte de alimentação do individualismo
e do consumismo.
Estes são alguns dos fatores condicionantes de nossa maneira de pensar
como também de agir violentamente, contrariando os ensinos do Cristo.
Mas onde está a fonte, a raiz da violência?
Está dentro de cada um de nós. Se não fôssemos violentos, o mundo não
o seria? É possível que esteja faltando a aplicação dos preceitos morais do
Cristo.
7. PRATICANDO O AMOR AO PRÓXIMO
A Prática do amor ao próximo pode ser vista em função da obediência
aos ensinamentos de Jesus. Nesse sentido, quando perdoamos não sete mas
setenta vez sete a ofensa recebida, quando aguardamos até o dia seguinte para
querelar com o nosso vizinho, quando exercitamos a nossa paciência diante das
mais ásperas dificuldades, quando procuramos dar o exemplo, quando
respeitamos a liberdade alheia, quando fazemos todos os esforços para não nos
omitirmos, estaremos nos exercitando no amor ao próximo.
8. CONCLUSÃO
Amar ao próximo como a si mesmo é um trabalho árduo que deve começar
bem, pois caso contrário o resultado é nulo. Muitas vezes implica num
sacrifício total da liberdade humana, coisa que nem sempre estamos dispostos
a praticá-la.
9. BIBLIOGRAFIA CONSULTADA
Polis - Enciclopédia Verbo da Sociedade e do Estado. Lisboa/São Paulo,
Verbo, 1986.
CURTI, R. Espiritismo e Reforma Íntima. 3. ed., São Paulo, FEESP,
1981.
KARDEC, A. O Evangelho Segundo o Espiritismo. 39. ed., São
Paulo, IDE, 1984.
KARDEC, A. O Livro dos Espíritos. 8. ed., São Paulo, FEESP, 1995.
São Paulo, abril de 2001
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