LEONARDO
MACHADO
leo@leonardomachado.com.br e www.leonardomachado.com.br
Recife, Pernambuco (Brasil)
Pagar o mal com o bem
Em uma cela, na prisão de
Atenas, o velho Critão, figura exaltada e muito admiradora do amigo Sócrates,
ia ter com o sábio grego, que, àquela altura, encontrava-se encarcerado à
espera da execução de sua sentença: a morte através da cicuta, veneno letal.
Na realidade, ele não conseguia
entender a postura do amigo que não reagia diante da situação em que se
encontrava.
“Como o filósofo podia aceitar
semelhante injustiça?” – pensava, talvez, Critão... Nesse sentido, ele
obtemperou:
− Dá-me ouvido e põe-te a
salvo. Não é muito dinheiro que certas pessoas querem receber para levar-te
daqui e salvar-te. Os meus haveres estão a tua disposição, além dos outros
estrangeiros, como Símias e Cebes, que não hesitariam em ajudar-te a sair.
Vamos, resolve-te.
Sócrates, paciente que era,
observava o discurso do fiel, porém inadvertido amigo. E, ao término do mesmo,
falaria tais verdades sublimes:
− Meu caro Critão, jamais se
deve proceder contra a justiça. Não se deve retribuir a injustiça com a
injustiça, pois o procedimento injusto é sempre inadmissível. Lembra-te, ainda,
que entre fazer um mal a uma pessoa e cometer uma injustiça não há diferença
nenhuma. Sendo assim, em suma, não devemos retribuir a injustiça, nem fazer o
mal a pessoa alguma, seja qual for o mal que ela nos cause. Devo partir, mesmo
que vítima da justiça, não a real, mas a dos homens. Se, porém, evadir-me,
retribuindo vergonhosamente a injustiça com a injustiça, o dano com o dano,
estarei indigno, e, lá nas Leis do Hades, não haverão de me acolher com
benevolência. Procedamos, pois, pagando o mal com o bem, porque tal é o caminho
por onde a divindade nos guia.
Com essas palavras, Sócrates
veio preludiar a doutrina de pagar o mal com bem. E, lembrando a questão 887
de O Livro dos Espíritos, na qual se encontra que “amar os inimigos
é perdoar-lhes e lhes retribuir o mal com o bem”, pode-se afirmar, com certeza,
que tais ensinamentos dirigidos a Critão e à humanidade são, na realidade, o
prelúdio para o Sermão do Monte de Jesus, quando, então, o
Mestre maior diria que era preciso dar a face esquerda quando nos batessem na
direita; que não bastava amar os amigos, mas que era preciso, também, amar os
inimigos, conforme anota o evangelista Mateus (5:39 e 44).
Na vida, desse modo, é bem
provável que nos cheguem muitas pedras pelo caminho. Mesmo quando estivermos
imbuídos de total desinteresse no serviço do amor, é bem natural que, aí
também, aproximem-se de nós a calúnia, o julgamento superficial e a inveja, tão
somente por querermos construir a nossa estrada de redenção, enquanto outros,
por padecerem da falta de entendimento, se demorem ainda em atitudes pequenas,
mesmo que disfarçadas.
Mas se os homens deram ao sábio
a cicuta e ao Mestre maior a cruz, o que poderíamos esperar receber? A
compreensão? De fato, ilusão...
Entretanto, nem nesses momentos
devemos parar no caminho. Ao contrário, devemos construir essa nossa estrada
com essas pedras que nos atiram, retribuindo, desse modo, o mal com o bem, como
ensinara o filósofo e sublimara o Cristo.
Continuemos, pois...
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