ESPÍRITOS
PROTETORES
Humberto
de campos
Jehul, elevada entidade
de uma das mais belas regiões da vida espiritual, foi chamado pelo
caricioso apelo de um nobre mensageiro da Verdade e do Bem, que lhe falou
nestes termos:
- Uma das almas a que te
vens devotando particularmente, de há muitos séculos, vai agora ressurgir
nas tarefas da reencarnação sobre a Terra. Seus destinos foram agravados
de muito em virtude das quedas a que se condenou pela ausência de qualquer
vigilância, mas o Senhor da Vida concedeu-lhe nova oportunidade de resgate
e elevação.
Jehul sorriu e exclamou,
denunciando sublimes esperanças:
- É Laio?
- Sim - replicou o
generoso mentor -, ele mesmo, que noutras eras te foi tão amado na Etrúria.
Atendendo às tuas rogativas, permite Jesus que lhe sejas o guardião
desvelado, através de seus futuros caminhos. Ouve, Jehul ! - serás seu
companheiro constante e invisível, poderás inspirar-lhe pensamentos
retificadores, cooperar em suas realizações proveitosas, auxiliando-o em
nome de Deus; mas, não esqueças que tua tarefa é de guardar e proteger,
nunca de arrebatar o coração do teu tutelado das experiências próprias,
dentro do livre-arbítrio espiritual, a fim de que construa suas estradas
para o Altíssimo com as próprias mãos.
Jehul agradeceu a
dádiva, derramando lágrimas de reconhecimento.
Com que enlevo pensou
nas possibilidades de conchegar ao seio aquele ser amado que, havia tanto
tempo, se lhe perdera do caminho!... Laio lhe fora filho idolatrado na
paisagem longínqua. É certo que não lhe compreendera a afeição, na recuada
experiência. Desviara-se das sendas retas, quando ele mais esperava de sua
mocidade e inteligência; seu coração carinhoso, porém, preferira ver no
fato um incidente que o tempo se encarregaria de eliminar. Agora,
tomá-lo-ia de novo nos braços fortes e o reconduziria à Casa de Deus.
Suportaria, corajosamente, por ele, a pesada atmosfera dos fluidos
materiais. Toleraria, de bom grado, os contrastes da Terra. Todos os
sofrimentos eventuais seriam poucos, pois acabava de alcançar a
oportunidade de erguer, dentre as dores humanas, um irmão muito amado, que
fora se\! filho inesquecível.
O generoso amigo
espiritual atravessou as paisagens maravilhosas que o separavam do
ambiente terrestre. Ficaram para trás de seus passos os jardins suspensos,
repletos de flores e de luz. As melodias das regiões venturosas
distanciavam-se-lhe dos ouvidos.
Esperançoso,
desassombrado, o solícito emissário penetrou a atmosfera terrestre e
achou-se diante de um leito confortável, onde se identificava um
recém-nascido pelo seu brando choramingar. Os Espíritos amigos,
encarregados de velar pela transição daquele nascimento, entregaram-lhe o
pequenino, que Jehul beijou, tomado de profunda emoção, apertando-o de
encontro ao peito afetuoso.
E era de observar-se,
daí em diante, o devotamento com que o guardião se empenhou na tarefa de
amparar a débil criança. Sustentou, de instante a instante, o espírito
maternal, solucionando, de maneira indireta, difíceis problemas orgânicos,
para que não faltassem os recursos da paz aos primeiros tempos do
inocentinho humano. E Jehul ensinou-lhe a soletrar as primeiras palavras,
reajustando-lhe as possibilidades de usar novamente a linguagem terrestre.
Velou-lhe os sonos, colocou-o a salvo das vibrações perniciosas do
invisível, guiou-lhe os primeiros movimentos dos pés. O generoso protetor
nada esqueceu, e foi com lágrimas de emoção que inspirou ao coração
materno as necessidades da prece para a idolatrada criancinha. Depois das
mãos postas para pronunciar o nome de Beus, o amigo desvelado acompanhou-a
a escola, a fim de restituir-lhe, sob as bênçãos do Cristo, a luz do
raciocínio.
Jehul não cabia em si de
contentamento e esperança, quando Laio se abeirou da mocidade.
Então, a perspectiva dos
sentimentos transformou-se.
De alma aflita, observou
que o tutelado regressava aos, mesmos erros de outros tempos, na,
recapitulação das experiências necessárias. Subtraía-se, agora, à
vigilância afetuosa dos pais, inventava pretextos desconcertantes e, por
mais que ouvisse as advertências preciosas e doces do mentor espiritual,
no santuário da consciência, entregava-se, vencido, aos conselheiros de
rua, caindo miseravelmente nas estações do vício.
Se Jehul lhe apontava o
trabalho como recurso de elevação, Laio queria facilidades criminosas; se
alvitrava providências da virtude, o fraco rapaz desejava dinheiro com que
se desvencilhasse dos esforços indispensáveis e justos. Entre sacrifícios
e dores ásperas, o prestimoso guardião viu-o gastar, em prazeres
condenáveis, todas as economias do suor paternal, assistindo aos
derradeiros instantes de sua mãe, que partia, da Terra, ferida pela
ingratidão filial. Laio relegara todos os deveres santos ao abandono,
entregando-se à ociosidade destruidora. Não obstante os cuidados do mentor
carinhoso, procurou o álcool, o jogo e a sífilis, que lhe sitiaram ,a
existência consagrada por ele ao desperdício. O dedicado amigo,
entretanto, não desanimava.
Após o esgotamento dos
recursos paternos, Jehul cooperou junto de companheiros prestigiosos, para
que o tutelado alcançasse trabalho.
Embora contrafeito e
subtraindo-se, quanto possível, ao cumprimento das obrigações, Laio
tornou-se auxiliar de urna empresa honesta, que, às ocultas, era objeto de
suas críticas escarnecedoras. Quem se habitua à ociosidade criminosa
costuma caluniar os bens do espírito de serviço.
De nada valiam os
conselhos do guardião, que lhe falava, solícito, nos quais profundos
recessos do ser.
Daí a pouco tempo, menos
por amor que por necessidade, Laio buscou uma companheira. Casou-se. Mas,
no desregramento que se entregava de muito tempo, não encontrou matrimônio
senão sensações efêmeras que terminavam em poucas semanas, como a
potencialidade de um fósforo que se apaga em alguns segundos. Jehul, no
entanto, alimentou a esperança de que talvez a união conjugal lhe
proporcionasse oportunidade para ser convenientemente ou não. Isso,
todavia, não aconteceu. O tutelado não sabia tratar a esposa senão entre
desconfianças e atitudes violentas. Sua casa era uma seção do mundo
inferior a que havia confiado seus ideais. Recebendo três filhinhos para o
jardim do lar, muito cedo lhes inoculava no coração as sementes do vício,
segregando-os num egoísmo cruel.
Quando viu o infeliz
envenenando outras almas que chegavam pela bondade infinita de Deus para a
santa oportunidade de serviços novos, Jehul sentiu-se desolado e,
reconhecendo que não poderia prosseguir sozinho naquela tarefa, solicitou
o socorro dos Anjos das Necessidades. Esses mensageiros de educação
espiritual lhe atenderam atenciosamente aos rogos, começando por alijar o
tutelado do emprego em que obtinha o pão cotidiano. Entretanto, em lugar
de melhorar-se com a experiência buscando meditar como convinha, Laio
internou-se por uma rede de mentiras, fazendo-se de vítima para recorrer
às leis humanas e ferir as mãos de antigos benfeitores. Acusou pessoas
inocentes, exigiu indenizações descabidas, tornou-se odioso aos amigos de
outros tempos.
Jehul foi então mais
longe, pedindo providências aos Anjos que se incumbem do Serviço das
Moléstias úteis, os quais o auxiliaram de pronto, conduzindo Laio ao
aposento da enfermidade reparadora, a fim de que o mísero pudesse refletir
na indigência da condição humana e na generosa paternidade do Altíssimo;
aquele homem rebelde, contudo, pareceu piorar cem por cento. Tornou-se
irascível e insolente, abominava o nome de Deus, sujava a boca com
inúmeras blasfêmias. Foram necessários verdadeiros prodígios de paciência
para que Jehul lhe lavasse do cérebro esfogueado e caprichoso os
propósitos de suicídio. Foi aí que, desalentado quanto aos recursos postos
em prática, o bondoso guardião implorou os bons ofícios dos Anjos que se
encarregam dos Trabalhos da Velhice Prematura. Os novos emissários
rodearam Laio com atenção, amoleceram-lhe. as células orgânicas,
subtraíram-lhe do rosto a expressão de firmeza e resistência,
alvejaram-lhe os cabelos e enrugaram-lhe o semblante. No entanto, o
infeliz não cedeu. Preferia ser criança ridícula nas aparências de um
velho, a entrar em acordo com o programa da Sabedoria Divina, a favor de
si mesmo.
Enquanto blasfemava, seu
amigo orava e desdobrava esforços incessantes; enquanto praticava
loucuras, o guardião duplicava sacrifícios e esperanças.
O tempo passava célere,
mas, um dia, o Anjo da Morte veio espontaneamente ao grande duelo e falou
com doçura:
- Jehul, chegou a
ocasião da tua retirada!. . .
O generoso mentor abafou
as lágrimas de angustiosa surpresa. Fixou o mensageiro com olhos doridos e
súplices; o outro, no entanto, continuou:
- Não intercedas por
mais tempo! Laio agora me pertence. Conduzi-lo-ei aos meus domínios, mas
podes rogar a Deus que o teu tutelado recomece, mais tarde, outra vez...
Terminara a grande
partida. A Morte decidira no feito, pelos seus poderes transformadores,
enquanto o guardião recolhia, entre lágrimas, o tesouro de suas esperanças
imortais. .
E, grafando esta
história, lembro-me que quase todos os Espíritos encarnados têm algum
traço do Laio, ao passo que todos os Espíritos protetores têm consigo os
desvelos e os sacrifícios de Jehul.
Livro Reportagens do Além Túmulo-
Psicografia Chico Xavier
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