POEMA DE
UMA ALMA
Marta
Numa região alcatifada de luminosas neblinas, o Anjo da Redenção recebia
as almas que regressavam da Terra, mostrando-lhes nos firmamentos
constelados os sóis que enchiam de melodia e luminosidade o abismo do
Universo.
Um dos egressos do mundo terreno aproximou-se-lhe, exclamando em soluços
:
– Anjo Salvador, venho da Terra como um náufrago desvalido!... Ouro e
honrarias não me deram a paz ambicionada! Estou só com a minha consciência
dilacerada ; que fazer, ó mensageiro da redenção, para alcançar aqueles
páramos radiosos de ventura que nos aponta a tua mão resplandecente?...
– Filho – replicou-lhe com bondade – a solidão em que te achas foi criada
pelo teu egoísmo... aquelas mansões de alegria, onde entrevês a felicidade
intraduzível,,são conquistadas com o que se faz em bem dos outros...
Escuta-me! a terra ainda é a região dos resgates penosos; milhões de
seres lá sofrem e choram, lutam e desfalecem. Volta a esse mundo e prende-te
às suas leis.
Come do seu pão e sofre-lhe as iniqüidades! Labora na grande oficina da
abnegação e do sacrifício.
Lá encontrarás ciladas tentadoras, mas estarás em temporário olvido para
que se valorize o teu esforço.
Não te esqueças de amar aos teus semelhantes com o esquecimento dos teus
próprios interesses, e quando alcançares o absoluto desprendimento da
matéria, terás o poder de criar as tuas próprias asas !... Conhecerás então
as belezas universais e conhecerás as flores sublimes dos paramos siderais
quando se sabe plantar as sementes da renúncia no sola ingrato da Terra!...
A Alma então animada, resoluta, atirou-se ao círculo das reencarnações
benfazejas.
Inúmeras vezes fracassou no caminho fácil das tentações. O Demônio da
Sexualidade, a Ambição do Ouro, Egoísmo da Posse, a Inquietação da Fama
prenderam-na por muitos séculos de dor e de tormento.
Ia somente aos palácios da Morte para se banhar no pranto dos
arrependimentos salvadores, retornando à luta com o firme propósito da
vitória ; até que um dia escolheu um ambiente de lágrimas dolorosas para os
seus combates. Sua infância foi uma longa tortura e toda a sua vida um
rosário de aflições e de angústias ; viu o escárnio em lábios que
estremecia, feriu-se nos espinhos da ingratidão e chorou na confiança
traída.
Tudo, porém, suportou com serenidade espartana e com paciência
evangélica. Sorriu aos trabalhos e dificuldades da sua existência,
sacrificando-se penosamente!...
Todavia, uma hora chegou em que as privações lhe trouxeram o alvará da
liberdade.
Adormeceu tranquilamente nos braços misericordiosos da Morte e livre da
reencarnação e da miséria despertou no santuário esplendoroso da Redenção
onde um anjo divino lhe descerrou as portas da Imensidade ; então a Alma
liberta, entre lágrimas de reconhecimento e de júbilo, alou-se ao Infinito,
em cujos jardins deslumbrantes foi colher a flor da sempiterna ventura.
Marta
(Recebida em Pedro Leopoldo a 6 de dezembro de 1934)
Do livro Palavras do Infinito. Psicografia
de Francisco Cândido Xavier.
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